18/05/2015, 10h43m.
Notas e adendos:
[1] Diegese: a dimensão ficcional de uma narrativa; a realidade própria da narrativa (“mundo ficcional”, “vida fictícia”), à parte da realidade externa de quem lê (o chamado “mundo real” ou “vida real”). O tempo diegético e o espaço diegético são, assim, o tempo e o espaço que decorrem ou existem dentro da trama. Algo é diegético quando ocorre dentro da ação narrativa ficcional do próprio filme. Por exemplo, uma música de trilha sonora incidental que acompanha uma cena faz parte do filme mas é externa à diegese, pois não está inserida no contexto da ação. Já a música que toca se um personagem está escutando rádio é diegética, pois está dentro do contexto ficcional.
[2] “Napalm é um conjunto de líquidos inflamáveis à base de gasolina gelificada, utilizados como armamento militar. O napalm é na realidade o agente espessante de tais líquidos, que quando misturado com gasolina a transforma num gel pegajoso e incendiário (…). O napalm foi desenvolvido em 1942 durante a Segunda Guerra Mundial nos Estados Unidos por uma equipe de químicos da Universidade Harvard (…) O napalm foi usado em lança-chamas e bombas pelos Estados Unidos e nações aliadas, para aumentar a eficiência dos líquidos inflamáveis. A substância é formulada para queimar a uma taxa específica e aderir aos materiais. (…) Diversos lançadores foram desenvolvidos para seu uso, culminando nas armas lança-chamas utilizadas contra os exércitos vietnamitas no fim da década de 1960” ("fonte":
http://pt.wikipedia.org/wiki/Napalm).
[3] “O mito da caverna, também chamado de Alegoria da caverna, foi escrito pelo filósofo Platão, e encontra-se na obra intitulada A República (livro VII). Trata-se da exemplificação de como podemos nos libertar da condição de escuridão que nos aprisiona através da luz da verdade. (…) Imaginemos um muro bem alto separando o mundo externo e uma caverna. Na caverna existe uma fresta por onde passa um feixe de luz exterior. No interior da caverna permanecem seres humanos, que nasceram e cresceram ali. Ficam de costas para a entrada, acorrentados, sem poder locomover-se, forçados a olhar somente a parede do fundo da caverna, onde são projetadas sombras de outros homens que, além do muro, mantêm acesa uma fogueira. Os prisioneiros julgam que essas sombras sejam a realidade. Um dos prisioneiros decide abandonar essa condição e fabrica um instrumento com o qual quebra os grilhões. Aos poucos vai se movendo e avança na direção do muro e o escala, com dificuldade enfrenta os obstáculos que encontra e sai da caverna, descobrindo não apenas que as sombras eram feitas por homens como eles, e mais além todo o mundo e a natureza” ("fonte":
http://pt.wikipedia.org/wiki/Mito_da_caverna).
[4] “Os lugares narrativos da fábula. Se a narrativa possui as suas estruturas-tipo, a fábula também se apresenta sob a forma de lugares narrativos bem reconhecíveis. (…) na multiplicidade das construções narrativas, esconde se apenas um número limitado e repetido de situações dramáticas. À primeira vista, e a grosso modo, pensa-se que todo filme conta uma história diferente. Daí vem a necessidade de se aplacar esta impressão de multiplicidade – uma ilusão! – através de um mecanismo redutor que faça esclarecer os arquétipos do gênero fabulístico. Com maior frequência, quatro são os mais utilizados lugares narrativos na fábula: a viagem, a educação sentimental, a investigação, e o elemento deflagrador. (1) A viagem. É o topos – configurações que o material narrável adota no plano da dispositio – que ostenta os mais ilustres precedentes, a começar pela Odisséia, de Homero, até On the road, de Jack Kerouac. É também o mais congenial ao cinema que sempre mostrou uma predileção particular por histórias tendo por tema a descrição de um itinerário físico durante o qual, entre mil dificuldades e imprevistos, o protagonista passa de um estado de ignorância a um estado de conhecimento. Ou, como se pode também dizer: do pecado à salvação. A viagem é pontuada por etapas que se constituem em estações de um percurso interior que conduz do Erro inicial à Verdade final. É isso que se vê, por exemplo, em O Sétimo selo (…), Paisagem sob a neblina, do grego Theo Angelopoulos (…), Quando é preciso ser homem/The soldier blue, 71, de Ralph Nelson (…)”. Fragmento do "curso de cinema de André Setaro":
http://setarosblog.blogspot.com/2007/09/introduo-ao-cinema-14.html.
[5] Campbell, Joseph & Moyers, Bill. O poder do mito. Trad. Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Palas Athena, 1990, p.155. O oceano simboliza o inconsciente, o desconhecido. O mar também simboliza incerteza, dúvida, indecisão, e simboliza o coração humano, lugar das paixões (Chevalier, Dicionário de símbolos, Ed. José Olympio, p.592-3); simboliza o caos primordial e a essência divina (Chevalier, p.650).
[6] O
self é o símbolo da totalidade psíquica, o núcleo mais profundo da psique. Símbolos do Self para o homem um iniciador masculino, guru, guardião, velho sábio, Merlin, Hermes. O grande homem interior age como um redentor que tira o inconsciente do mundo e dos seus sofrimentos para levá-lo de volta à sua esfera original eterna. É o alvo final da vida. O objetivo principal do homem não é comer, beber, etc., mas ser humano. A orientação extrovertida do ego em direção ao mundo exterior há de desaparecer para dar lugar ao homem cósmico. Isso acontece quando o ego se incorpora ao
Self. O fluxo discursivo das representações do ego (que vai de um pensamento a outro) e de seus desejos (que correm de um objeto a outro) acalmam-se quando é encontrado o grande homem interior (Jung et allii. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro : Ed. Nova Fronteira, 2000, p.196-210, passim).
[7] O ritual de iniciação envolve sempre uma morte simbólica (identidade temporariamente destruída ou dissolvida no inconsciente coletivo) e um salvamento solene pelo renascimento. Entre os jovens o tema mais comum é a prova de força. Na iniciação rompem-se os laços com o mundo infantil. O objetivo fundamental da iniciação é domar a turbulência da natureza jovem. A iniciação tem propósito civilizador (espiritual). Há uma ambivalência, conflito entre aventura e disciplina, mal e virtude, liberdade e segurança. A iniciação envolve um rito de submissão, depois um período de contenção e depois um de libertação. Alguns homens precisam ser provocados, sua iniciação tem a violência do rito de trovão dionisíaco. Outros tem de ser dominados, e a submissão vem da organizada planificação dos templos, religião apolínea. Uma iniciação completa abrange os dois temas. Outro tipo de simbolismo refere-se à libertação do homem (ou sua transcendência) de uma forma restritiva de vida para progredir a um estágio superior mais amadurecido de sua evolução. Símbolo mais freqüente de transcendência/libertação é o tema da jornada solitária ou peregrinação, onde o iniciado descobre a natureza da morte. No rito da iniciação o noviço tem de renunciar a toda ambição, aceitar a morte, fazer a prova sem esperar sucesso. Geralmente a iniciação é guiada por um xamã, representação do herói mítico Trickster (Joseph L. Henderson, Os mitos antigos e o homem moderno, in Jung et allii. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro : Ed. Nova Fronteira, 2000, pp. 135-160, passim).
[8] A imagem é eloquente como efeito cinematográfico, porque indica visualmente o instante em que o mundo de Willard vira de cabeça para baixo. Mas sua figura, segura no ar de ponta-cabeça, faz imediatamente lembrar do 12º arcano maior do tarô, o Enforcado, que mostra exatamente um homem suspenso, preso pelo pé e com a cabeça apontada em direção à terra. Sobre o simbolismo do Enforcado ensina Chevalier que esse arcano tem origem e derivação de outros dois, o Diabo e o Eremita. A figura de Kurtz, que é a causa de Willard chegar ao ponto em que está, lembra a de um eremita, pois desertou e se escondeu no coração da selva, onde se tornou uma espécie de guru pagão. E a feiúra da guerra que o filme mostra é, seguramente, diabólica. O Enforcado, ensina ainda Chevalier, representa a escravidão psíquica e o despertar liberador, os remorsos, as prisões de toda espécie, o desejo de se libertar de um jugo; simboliza todo homem que, absorvido por uma paixão, sujeito de corpo e alma à tirania de uma idéia ou de um sentimento, não tem consciência da sua escravidão. E conclui: o Enforcado marca bem o final de um ciclo, o homem se invertendo para enfiar a cabeça na terra para restituir o seu ser pensante à terra da qual foi moldado, é o arcano da restituição final, que é a condição da regeneração (Chevalier, Dicionário de símbolos, Ed. José Olympio, p.370-1).
[9] A lama é símbolo da matéria primordial e fecunda da qual o homem foi tirado, segundo a tradição bíblica. Mistura de terra e água, a lama une o princípio receptivo e matricial (a terra) ao princípio dinâmico da mutação e das transformações (a água). Entre a terra vivificada pela água e a água poluída pela terra, escalonam-se todos os níveis do simbolismo cósmico e moral (Chevalier, Dicionário de símbolos, Ed. José Olympio, p.533-4).
[10] Todos os rituais comportam processos particulares de morte iniciática. O candidato pode ser posto numa cova cavada ad hoc para ele. O neófito parece operar um processo de regressão, seu novo nascimento é comparado ao retorno ao estado fetal no ventre de uma mãe (Chevalier, Dicionário de símbolos, Ed. José Olympio, p.506).
[11] Iniciar é, de certo modo, fazer morrer, provocar a morte. Mas a morte é considerada uma saída, a passagem de uma porta que dá acesso a outro lugar. À saída, então, corresponde uma entrada. O iniciado transpõe a cortina de fogo que separa o profano do sagrado, e sofre, com esse fato, uma transformação, muda de nível, torna-se diferente (Chevalier, Jean & Gheerbrant, Alain. Dicionário de símbolos. 22a. ed., Rio de Janeiro: Ed. José Olympio, 2008, p.506).
[12] O culto de Mitra, que surgiu na Pérsia, propagou-se na Grécia e ali Mitra foi reverenciado como símbolo do triunfo do bem sobre o mal. Era venerado perto de nascentes ou cursos de água, indispensáveis para a purificação (Arcangeli, Alessandro, et allii. História das religiões. Trad: Carlos Nougué. Barcelona: Ediciones Folio, 2008, ISBN 978-84-413-2488-6, p. 95). No filme, o local do encontro de Willard e Kurtz, e do sacrifício aqui mencionado, é a nascente do rio. “O ritual de iniciação nos mistérios de Mitra era o taurobólio, que consistia em um ritual de sacrifício do touro. Sobre uma forte estrutura em forma de rede entrelaçada de aço ou ferro, era imolado um touro pelos sacrificadores, e seu sangue escorria sobre o iniciado que ficava abaixo desta estrutura, nu, em uma fossa cavada ao chão. Aí, recebia o sangue, piedosamente, sobre a cabeça e banhava com ele todo seu corpo. O iniciando abria a boca para beber avidamente o sangue. (…) A festa continuava após a imolação do touro”. “O matar o touro constitui o motivo principal do culto mitraico. (…) Sacrificado o touro, tem lugar um banquete. Sua carne é consumida e seu sangue, bebido (…). Acreditava-se que, através da consumação da carne e do sangue do touro, o adepto buscava o nascimento para uma nova vida. A carne e o sangue conferem não somente força corporal, mas também são salutares para a alma e benéficas ao renascimento na luz eterna”. “As sucessivas conquistas dos césares foram a principal causa da difusão da religião mitraica no mundo latino. Por volta de 70 a.C., o mitraísmo penetrou em Roma. Começou a espalhar-se sob o império dos flavianos e no tempo dos antoninos e severos desenvolveu-se enormemente. (…) Devido ao seu caráter de força e beligerância, Mitra obteve a maioria de seus adeptos no Exército Romano. A todos que se engajavam sob as águias romanas, o deus podia prestar seu apoio. A assistência no campo de batalha e a disciplina militar que ele exigia foram importantes na propagação do culto de Mitra e seu reconhecimento oficial. Mitra era o protetor e patrono das armas”. Marília Teresa Bandeira de Melo.
Mitra, mitraísmo: o sacrifício do touro. "Fonte":
http://www.geocities.ws/edterranova/raven050.html.
[13] O sacrifício é a idéia central das cosmogonias. Não há criação sem sacrifício. Sacrificar o que se estima é sacrificar-se. a energia espiritual que se obtém com isto é proporcional à importância da perda (Cirlot, Juan-Eduardo. Dicionário de Símbolos. Trad. Rubens Eduardo Ferreira Frias. São Paulo: Editora Moraes, 1984, p.507).
[14] Segundo a psicologia analítica pedras preciosas são frequentemente símbolos do self (M. L. von Franz. O Processo de Individuação. In: Jung et allii. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro : Ed. Nova Fronteira, 2000, p.208). Vide nota 6 acima. No filme, Kurtz recebe o tiro de diamante no centro da testa quando percebe o que pensa ser a natureza do inimigo. O diamante aparece nos emblemas como centro místico irradiante, um símbolo dos conhecimentos morais e intelectuais, do coroamento de um processo construtivo (Cirlot, Juan-Eduardo. Dicionário de Símbolos. Trad. Rubens Eduardo Ferreira Frias. São Paulo: Editora Moraes, 1984, p. 209). Essa claridade no centro da testa faz lembrar imediatamente o terceiro olho, o olho de Xiva, da sabedoria, do Dharma, do coração, da alma. Enquanto o olho direito corresponde ao sol e à visão da atividade e do futuro, o esquerdo representa a lua, a passividade, a visão do passado, o terceiro olho corresponde ao fogo, e seu olhar reduz tudo a cinzas, porque exprime o presente sem dimensões, permitindo que as coisas sejam apreendidas simultaneamente, criando a percepção unitiva, a visão sintética (Chevalier, Jean & Gheerbrant, Alain. Dicionário de símbolos. 22ª ed., Rio de Janeiro: Ed. José Olympio, 2008, p.654).
[15]. O antropólogo e ensaísta estadunidense Joseph Campbell é um dos maiores responsáveis pela divulgação da narratologia, com suas obras “A Jornada do Herói”, “O Herói de Mil Faces”, “O Poder do Mito” e o conceito de monomito (adaptado de James Joyce), segundo o qual todos os grandes mitos-fundadores das culturas humanas seriam, em última análise, um só. Para Campbell, a imensa maioria dos mitos trabalha com heróis arquetípicos Esta abordagem estende uma visão estruturalista das narrativas, procurando nelas determinados paradigmas e estruturas que se repetem, a despeito de contextos culturais e históricos. Ele se baseou nas idéias de Carl Jung sobre o simbolismo na interpretação dos sonhos e na pesquisa de Wilhelm Stekel sobre a aplicação de temas do imaginário e do inconsciente humano à ficção (em literatura, teatro e cinema). O etnógrafo Franz Boas e o antropólogo Leo Frobenius também influenciaram a visão de história cultural do pesquisador. Em breve resumo as etapas características da jornada do herói são: 1. Mundo Comum – O mundo normal do herói antes da história começar. 2. O Chamado da Aventura – Um problema se apresenta ao herói: um desafio ou a aventura. 3. Reticência do Herói ou Recusa do Chamado – O herói recusa ou demora a aceitar o desafio ou aventura, geralmente porque tem medo. 4. Encontro com o mentor ou Ajuda Sobrenatural – O herói encontra um mentor que o faz aceitar o chamado e o informa e treina para sua aventura. 5. Cruzamento do Primeiro Portal – O herói abandona o mundo comum para entrar no mundo especial ou mágico. 6. Provações, aliados e inimigos ou A Barriga da Baleia – O herói enfrenta testes, encontra aliados e enfrenta inimigos, de forma que aprende as regras do mundo especial. 7. Aproximação – O herói tem êxitos durante as provações. 8. Provação difícil ou traumática – A maior crise da aventura, de vida ou morte. 9. Recompensa – O herói enfrentou a morte, se sobrepõe ao seu medo e agora ganha uma recompensa (o elixir). 10. O Caminho de Volta – O herói deve voltar para o mundo comum. 11. Ressurreição do Herói – Outro teste no qual o herói enfrenta a morte, e deve usar tudo que foi aprendido. 12. Regresso com o Elixir – O herói volta para casa com o “elixir”, e o usa para ajudar todos no mundo comum. Vide, a respeito: Campbell, Joseph & Moyers, Bill. O poder do mito. Trad. Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Palas Athena, 1990.
[16]. A foice é atributo de Saturno e das alegorias da morte. A foice é também símbolo da colheita, da nova esperança de renascimento, da dualidade do princípio como fim e vice-versa (Cirlot, Juan-Eduardo. Dicionário de Símbolos. Trad. Rubens Eduardo Ferreira Frias. São Paulo: Editora Moraes, 1984, p. 260).
ENCYCLOPAEDIA V. 51-0 (11/04/2016, 10h24m.), com 2567 verbetes e 2173 imagens.
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