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Erotismo


vb. criado em 08/04/2016, 21h55m.

index do verbete

sobre velhice e erotismo

Em A república (2007), Platão adota linha semelhante. No Livro I, Sócrates vai ao Pireu orar para a deusa e decide ficar, a convite d e Polemarco, para assistir à corrida de cavalos e à festa que ocorrerá à noite. Na casa de Polemarco, Sócrates encontra Céfalo, pai de seu anfitrião, que lhe parece bastante envelhecido. Céfalo, de fato, confirma que não tem mais forças para ir à cidade e incita Sócrates a visitá- lo mais, pois, “na medida em que vão murchando para um os prazeres físicos, nessa mesma aumentam o desejo e o prazer da conversa” (2007, p. 12). Sócrates lhe assegura que virá, pois tem prazer em conversar com pessoas idosas, e lhe pergunta se é muito dura a vi da “no limiar da velhice”. Céfalo, então, responde sintetizando o pensamento que, mais tarde, seria adotado por Cícero: Por Zeus que te direi, ó Sócrates, qual é o meu ponto de vista. [...] A maior parte de nós lamenta-se com saudades dos prazeres da juventude, ou recordando os gozos do amor, da bebida, da comida e outros da mesma espécie, e agastam-se como quem ficou privado de grande bens, e vivesse bem então, ao passo que agora não é viver. [...] Ora, eu já encontrei outros anciãos que não sentem dessa maneira, entre outros o poeta Sófocles, com quem deparei quando alguém lhe perguntava: “Como passas, ó Sófocles, em questões de amor? Ainda és capaz de te unires a uma mulher?” “Não digas nada, meu amigo!” – replicou. – Sinto-me felicíssimo por lhe ter escapado, como quem fugiu a um amo delirante e selvagem.” Pareceu-me que ele disse bem nessa altura, e hoje não me parece menos. Pois grande paz e libertação de todos esses sentimentos é a que sobrevém na velhice. Quando as paixões cessam de nos repuxar e nos largam, acontece exatamente o que Sófocles disse: somos libertos de uma hoste de déspotas furiosos. (PLATÃO, 2007, p. 1 3)

Aforismos para a sabedoria na vida (1964), posições semelhantes: Costuma-se dizer que a mocidade é o tempo feliz da vida e a velhice o infeliz. Estaria certo, se as paixões nos trouxessem felicidade. Ora, a mocidade é por elas arrastada em todas as direções, com pouca alegria e muito sofrimento [...] Basta ponderar que todo prazer é de natureza negativa e a dor de natureza positiva, para compreender que as paixões não nos podem fazer felizes, não sendo, pois, de lamentar que a velhice se veja privada de certas fruições [...] Quem muito mais acertadamente considera a velhice é Platão, ao mostrar que esta finalmente liberta do instinto sexual, que até então nos inquietara incessantemente. Poder-se-ia até afirmar que as variegadas e intermináveis fantasmagorias geradas por esse instinto, bem como as emoções delas decorrentes, mantêm o homem em um estado de contínua e branda loucura, enquanto permanece sob o império desse instinto ou desse diabo, que o mantém na possessão, de modo que só quando se extingue é que se torna inteiramente racional. (SCHOPENHAUER, 1964, p. 225- 226)

sobre erotismo em geral

Na cópula, explica Beauvoir, o sujeito tem uma relação narcísica consigo mesmo. Tem suas qualidades viris ou femininas afirmadas e se sente valorizado.

Georges Bataille: o erotismo reside, justamente, em uma forma particular de atividade sexual, só se manifestando quando o sexo ultrapassa a função meramente reprodutiva e se estabelece como busca de autoconhecimento, de completude.

O erotismo se sustenta no fato de os homens serem indivíduos descontínuos.

Conforme Bataille, há três tipos de erotismo: o erotismo dos corpos, o erotismo dos corações e o erotismo sagrado. Nas três formas trata-se sempre de substituir a descontinuidade por uma continuidade. Esse momento de fusão, sustenta Bataille, é sempre violento e, portanto, conduz à morte. Não se está aqui a tratar da morte física, do perecimento definitivo do corpo, mas do fim de um estado de ser para o surgimento de outro, que é o estado de totalidade, um instante apenas no somatório geral do tempo, em que o indivíduo se sente completo.

Por meio do Sexo, a Violência se manifesta: Toda a atividade do erotismo tem por fim atingir o ser no mais íntimo, no ponto onde ficamos sem forças. No movimento da dissolução dos seres, Toda a realização erótica tem por princípio uma destruição do ser fechado que, no estado normal, é um parceiro do jogo. Diante do inevitável – que a fusão sexual é passageira –, aparece então a paixão como uma possibilidade de prolongar o efêmero, manter a continuidade e, por meio de um outro, manter o êxtase da plenitude. Manifesta-se, nesse caso, o erotismo dos corações.

A paixão dos amantes, ou prolonga a fusão dos corpos, ou serve para introduzi-la. Pode ser mais violenta que o sexo, pois embora prometa a felicidade, inicialmente traz, à vida do amante, “a confusão e a desordem”. Por isso se diz que a paixão é violência.

O erotismo sagrado. A morte pelo sacrifício é parte fundamental dos rituais religiosos – no sacrifício, o coletivo presencia a morte de alguém. Na religião, a morte é também fundadora de um novo estado, uma nova realidade.

o erotismo também se manifesta por meio da paixão e da transcendência. Essa tríade, no entanto, tem uma característica: é prerrogativa exclusivamente humana.

Octavio Paz, argumenta , que o erotismo “é sexualidade socializada e transfigurada pela imaginação e vontade dos homens” (1994, p. 16), ou seja, é resultado da cultura O erotismo é invenção, variação incessante; o sexo é sempre o mesmo. O protagonista do ato erótico é o sexo ou, mais exatamente, os sexos. O plural é obrigatório [...] o desejo sexual inventa sempre um parceiro imaginário... ou muitos. Em todo o encontro erótico há um personagem invisível e sempre ativo: a imaginação, o desejo. É apenas quando o sexo envolve imaginação que se está na presença de um ato erotizado, ainda que seja possível ao homem civilizado uma sexualidade sem erotismo, um sexo com animalidade.

Bataille situa o aparecimento do erotismo na gradual passagem da sexualidade livre para a sexualidade contida. antes da civilização não houvesse por que se falar em erotismo.

Segundo Bataille, a civilização teria se formado a partir de três aspectos: a consciência da morte, o trabalho e a sexualidade contida. Ainda que jamais tenha perdido um pouco do animal primitivo, à medida que o homem se tornou civilizado passou a contar com outra forma de sexualidade – o erotismo. O homem se desvencilhou da animalidade inicial. Ele escapou trabalhando, compreendendo que morria e passando da sexualidade livre à sexualidade envergonhada de onde nasceu o erotismo. Para saber do erotismo, segundo Bataille, a pessoa deve experienciar essas duas emoções contraditórias: o interdito e a transgressão, a lei e sua violação. O interdito reprime a violência que, para Bataille, é a reprodução sexual e a morte. Tanto sexo quanto morte remetem ao animal que existe em cada um dos seres. Por meio do sexo e da morte, atinge-se a continuidade, temida e desejada ao mesmo tempo.

O que chamamos de morte é em primeiro lugar a consciência que temos dela. Percebemos a passagem da vida à morte, isto é, ao objeto angustiante que é para o homem o cadáver de um outro homem. Para cada um daqueles que ele fascina, o cadáver é uma imagem de seu destino. Ele é testemunho de uma violência que não só destrói um homem, mas que destruirá todos os homens. O interdito que se apodera dos outros diante do cadáver é uma forma de rejeitar a violência, de se separar da violência. (BATAILLE, 1987, p. 41)

O horror à morte, conforme Bataille, não produz apenas a aversão ao cadáver, mas também o nojo. Seus excrementos, suas secreções, aquilo que seu próprio corpo, ainda no auge da vida, produz, também são objeto de repugnância. “uma área da imundície, da corrupção e da sexualidade”. Ao abordar o nojo, Bataille aprofunda uma questão fundamental no erotismo que é o desejo. Para ele, assim como não se pode falar de erotismo sem falar de morte, não há como falar de desejo sem falar da náusea, seu oposto. O desejo é feito de seu contrário, e seu contrário é o horror. Assim como o homem rejeita a violência da morte por meio da inumação, ele também rejeita a violência do sexo através de regras que procuram normatizar a vida sexual e evitam que o trabalho seja perdido e a sociedade destruída. Para o pensador francês, o interdito sexual se manifesta plenamente na transgressão. A essência do erotismo estaria na associação do prazer sexual e do interdito. O sexo é, basicamente, uma transgressão. O erotismo é uma atividade organizada. Trata-se de uma contradição: o sexo ameaça a organização e, no entanto, é necessário à manutenção da vida.

Não há como garantir a ordem social sem a possibilidade de transpor a lei, sem os jogos, as festas, o sexo. Nas religiões pagãs, acentua Bataille, eram Sagrados os aspectos puros e impuros. O cristianismo rompeu com isso rejeitando a impureza e admitindo apenas a pureza. Fora desse aspecto, restava a Culpa. Ao colocar o impuro fora do mundo sagrado, ao determinar que o impuro era profano, o cristianismo teria condenado o erotismo. Nas religiões pagãs, acentua Bataille, eram sagrados os aspectos puros e impuros. O cristianismo rompeu com isso rejeitando a impureza e admitindo apenas a pureza. Fora desse aspecto, restava a culpa. Ao colocar o impuro fora do mundo sagrado, ao determinar que o impuro era profano, o cristianismo teria condenado o erotismo.

Maffesoli sustenta que, na sociedade pós-moderna, o gozo, a transgressão, tornaram-se um valor cuja denominação, criada por ele, seria “orgiasmo”, ou aquilo que diz respeito ao excesso, à festa, à sexualidade múltipla, a mais de um parceiro, a mais de uma identidade. Defensor da ideia de que “é necessário, para que uma sociedade se reconheça enquanto tal, que ela possa pôr em jogo a desordem das paixões” (2005, p.18), o teórico questiona a crise dos imperativos trabalho e progresso ao aludir à crescente importância do lazer e da fruição nas comunidades modernas. Para o autor, Prometeu, o deus grego que roubou o fogo de Zeus para entregá-lo aos homens e que por isso foi punido e acorrentado, estaria em decadência. No lugar desse valor – o conhecimento, e o sacrifício para obtê-lo – estaria ressurgindo Dionísio, o deus do prazer e das festas.

Essa sucessão dos deuses na dinâmica cultural estaria ocorrendo com a substituição do corpo como meio de produção pelo corpo erótico: “O que era característica da vanguarda, dos artistas, dos gênios solitários e orgulhosos, ramifica-se no conjunto do corpo social. O gozo do presente, o carpe diem, torna-se valor massivo e irrecusável” – a teia formada pelos seres humanos está amarrada ao presente e esse presente é hedonista. A época atual não valoriza o conhecimento sobre o domínio da vida, mas sobre como dispendê-la e gozá-la Numerosas práticas humanas evidenciariam essa ligação entre o lúdico, o sexo e a morte.

Desde festas primitivas até inocentes comemorações familiares, todas são “perpassadas, de modo mais ou menos aparente, pela pregnância da finitude” : “A ordem cósmica, em sua invariância, era sempre tranquilizadora, e as festas lembravam o constante vai-e-vem entre essa ordem e o caos original”, “a morte tem esse estranho poder de suscitar a vida frenética”.

A sedução é uma Caça, a cobiça conduz ao Rapto e o ato sexual é um combate. O conjunto leva a resultados incertos. o. (MAFFESOLI, 2005, p. 80) : “Para além de ti, para além de mim, pelo corpo, no corpo, para além do corpo, nós queremos ver qualquer coisa. Esta qualquer coisa é o fascínio erótico, o que me tira para fora de mim e me leva para ti, o que me faz ir para além de ti” (PAZ, 1994, p. 27).

Bataille afirma que todo o erotismo é sagrado, pois tanto a experiência erótica quanto a religiosa têm o poder de levar o ser da descontinuidade à continuidade, da solidão ao êxtase. Coube ao cristianismo, entretanto, permitir ao interdito reinar de forma absoluta. Recordando um pouco do que foi exposto no primeiro capítulo, os interditos, conforme Bataille, têm como função frear o dispêndio, a sexualidade sem limites e a violência. São, portanto, construtores de sociedades civilizadas.

Ao contrário da mulher, que pode fingir, ou ignorar, o homem não tem como disfarçar suas intenções, pois sua anatomia visível o coloca na condição não apenas de potente, mas também de frágil.

Bataille “pelo cuidado que ela dá aos seus adereços, pelo cuidado que tem com sua beleza, que os adereços põem em relevo, uma mulher considera a si mesma como um objeto que ela, constantemente, propõe à atenção dos homens”

Embora pareça contraditório, os interditos não são racionais, pois há um ímpeto desmedido no tabu, que é fruto do medo e do horror. O interdito viabiliza o mundo racional, mas ele não é racional.

“A morte é um problema dos vivos. Os mortos não têm problemas”, sentencia Norbert Elias em A solidão dos moribundos

A psicanalista Vera Stringuini, em seu ensaio Sempre é tarde demais, em que analisa o conto O poncho, de Charles Kiefer, afirma que a compulsão por seduzir se deve ao amor incestuoso, e por isso interditado, pela mãe.

sobre a solidão do orgasmo

Aqui uma parte separada, sobre as comparações entre orgasmo e abismo, ou solidão, ou crise, ou algo assim solitário:

ENCYCLOPAEDIA V. 51-0 (11/04/2016, 10h24m.), com 2567 verbetes e 2173 imagens.
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