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vb. criado em 06/06/2013, 16h20m.

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Maniqueísmo

Maniqueísmo
Considerado durante muito tempo uma heresia cristã, possivelmente por sua influência sobre algumas delas, o maniqueísmo foi uma religião que, pela coerência da doutrina e a rigidez das instituições, manteve firme unidade e identidade ao longo de sua história.

Denomina-se maniqueísmo a doutrina religiosa pregada por Maniqueu -- também chamado Mani ou Manes -- na Pérsia, no século III da era cristã. Sua principal característica é a concepção dualista do mundo como fusão de espírito e matéria, que representam respectivamente o bem e o mal.

Maniqueu e sua doutrina. Maniqueu nasceu em 14 de abril do ano 216, no sul da Babilônia, região atualmente situada no Iraque, e na juventude sentiu-se chamado por um anjo para pregar uma nova religião. Pregou na Índia e em todo o império persa, sob a proteção do soberano sassânida Sapor (Shapur) I. Durante o reinado de Bahram I, porém, foi perseguido pelos sacerdotes do zoroastrismo e morreu em cativeiro entre os anos 274 e 277, na cidade de Gundeshapur.

Maniqueu se acreditava o último de uma longa sucessão de profetas, que começara com Adão e incluía Buda, Zoroastro e Jesus, e portador de uma mensagem universal destinada a substituir todas as religiões. Para garantir a unidade de sua doutrina, registrou-a por escrito e deu-lhe forma canônica. Pretendia fundar uma religião ecumênica e universal, que integrasse as verdades parciais de todas as revelações anteriores, especialmente as do zoroastrismo, budismo e cristianismo.

O maniqueísmo é fundamentalmente um tipo de gnosticismo, filosofia dualista segundo a qual a salvação depende do conhecimento (gnose) da verdade espiritual. Como todas as formas de gnosticismo, ensina que a vida terrena é dolorosa e radicalmente perversa. A iluminação interior, ou gnose, revela que a alma, a qual participa da natureza de Deus, desceu ao mundo maligno da matéria e deve ser salva pelo espírito e pela inteligência.

O conhecimento salvador da verdadeira natureza e do destino da humanidade, de Deus e do universo é expresso no maniqueísmo por uma mitologia segundo a qual a alma, enredada pela matéria maligna, se liberta pelo espírito. O mito se desdobra em três estágios: o passado, quando estavam radicalmente separadas as duas substâncias, que são espírito e matéria, bem e mal, luz e trevas; um período intermediário (que corresponde ao presente) no qual as duas substâncias se misturam; e um período futuro no qual a dualidade original se restabeleceria. Na morte, a alma do homem que houvesse superado a matéria iria para o paraíso, e a do que continuasse ligado à matéria pelos pecados da carne seria condenada a renascer em novos corpos.

Maniqueísmo como religião. A ética maniqueísta justifica a gradação hierárquica da comunidade religiosa, uma vez que varia o grau de compreensão da verdade entre os homens, fato inerente à fase de interpenetração entre luz e trevas. Distinguiam-se os eleitos, ou perfeitos, que levavam vida ascética em conformidade com os mais estritos princípios da doutrina. Os demais fiéis, chamados ouvintes, contribuíam com trabalho e doações. Por rejeitar tudo o que era material, o maniqueísmo não admitia nenhum tipo de rito nem símbolos materiais externos. Os elementos essenciais do culto eram o conhecimento, o jejum, a oração, a confissão, os hinos espirituais e a esmola.

Por sua própria concepção da luta entre o bem e o mal e sua vocação universalista, o maniqueísmo dedicou-se a intensa atividade missionária. Como religião organizada, expandiu-se rapidamente pelo Império Romano. Do Egito, disseminou-se pelo norte da África, onde atraiu um jovem pagão que mais tarde, convertido ao cristianismo, seria doutor da igreja cristã e inimigo ferrenho da doutrina maniqueísta: santo Agostinho. No início do século IV, já havia chegado a Roma.

Enquanto Maniqueu foi vivo, o maniqueísmo se expandiu para as províncias ocidentais do império persa. Na Pérsia, apesar da intensa perseguição, a comunidade maniqueísta se manteve coesa até a repressão dos muçulmanos, no século X, que levou à transferência da sede do culto para Samarcanda. Missionários maniqueístas chegaram no fim do século VII à China, onde foram reconhecidos oficialmente até o século IX. Depois foram perseguidos, mas persistiram comunidades de adeptos no país até o século XIV. No Turquestão oriental, o maniqueísmo foi reconhecido como religião oficial durante o reino Uighur -- séculos VIII e IX -- e perdurou até a invasão dos mongóis, no século XIII.

Posteridade do maniqueísmo. Embora não haja dados que permitam estabelecer uma vinculação histórica direta, o pensamento maniqueísta inspirou na Europa medieval diversas seitas ou heresias dualistas surgidas no seio do cristianismo. Entre elas, cabe citar a dos bogomilos, na Bulgária (século X) e, sobretudo, a dos cátaros ou albigenses, que se propagou no sul da França no século XII. Este último movimento foi uma das mais poderosas heresias da Europa, sufocada de modo sangrento no início do século seguinte.

f.: Barsa CD v. 1.11 (1995). Baseada na Nova Enciclopédia Barsa. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações (1 CD).

Gnosticismo

A progressiva divulgação no mundo romano, a partir do século I da era cristã, de doutrinas religiosas orientais -- dentre as quais o cristianismo não foi a primeira, e sim apenas mais uma -- e o apogeu de uma série de escolas filosóficas helenísticas de perfil acentuadamente místico, como o neopitagorismo e o neoplatonismo, estabeleceram o clima espiritual em que brotaram as concepções gnósticas.

A palavra gnose (do grego gnosis, "conhecimento") emprega-se, ao se tratar do movimento filosófico e religioso a que deu nome, para designar o conhecimento adquirido não por aprendizagem ou observação empírica, mas por revelação divina. À gnose, privilégio dos iniciados, opõe-se a pistis, ou mera crença. Os eleitos que recebiam a gnose experimentavam uma iluminação que era regeneração e divinização, e conheciam simultaneamente sua verdadeira natureza e origem. Reconheciam-se em Deus, conheciam a Deus e apareciam diante de si mesmos como emanados de Deus e estranhos ao mundo. Assim, adquiriam a certeza definitiva de sua salvação para toda a eternidade.

Até a descoberta, no século XX, de diversas coleções de manuscritos, entre os quais os de Nag Hammadi, Egito, era comum considerar o gnosticismo como uma forma de heresia cristã inspirada na filosofia grega. Atualmente, tende-se a falar num conjunto de escolas que, em virtude de princípios comuns, formam o movimento gnóstico. As noções compartilhadas pelas diversas escolas gnósticas podem resumir-se em três grandes temas: (1) a miséria do homem, prisioneiro de seu corpo, pois o gnóstico considerava a alma procedente de uma realidade supramundana; (2) a dualidade cósmica, na qual o mundo visível, mau e tenebroso, teria sido criado por um demiurgo perverso -- elemento tipicamente neoplatônico -- oposto a outro Deus, bom mas desconhecido; e (3) o Apocalipse gnóstico, em virtude do qual o mundo perverso seria substituído pelo reino divino. Os pneumáticos (conhecedores puros da gnose) ascenderiam até o pleroma, reino da luz e da perfeição, e o fogo latente oculto no cosmos se avivaria e consumiria toda a matéria.

As escolas gnósticas empregaram diferentes métodos de especulação. A maior parte dos estudiosos tende a considerar a existência de uma gnose não cristã, que englobaria movimentos como o hermetismo e o maniqueísmo, e de uma gnose cristã, herética. Esta última, formulada no século II por Basilides e Valentim, afirmava a realidade de um Deus transcendente e desconhecido, enquanto identificava o demiurgo criador do mundo físico com o Iavé bíblico. Os ataques a essa tese por parte de teólogos cristãos dos séculos II e III, como Hipólito e santo Irineu, fizeram com que o gnosticismo tenha sido considerado um desvio do cristianismo.

Por fim, alguns autores opinam que as teses enunciadas por Orígenes de Alexandria (séculos II-III), segundo as quais o objetivo da encarnação e morte de Jesus teria sido trazer o conhecimento ao homem enganado por seus sentidos, constituíram na realidade uma tentativa de assimilar a gnose à ortodoxia cristã.

f.: Barsa CD v. 1.11 (1995). Baseada na Nova Enciclopédia Barsa. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações (1 CD).

Neoplatonismo

Mais que simples retomada das idéias de Platão -- que sustentava existirem dois mundos: o visível, objeto dos sentidos, e o das idéias, objeto da inteligência -- e ao contrário do que o nome pode sugerir, o neoplatonismo foi uma verdadeira refundação da metafísica clássica.

Última grande corrente filosófica da Grécia antiga, o neoplatonismo é a doutrina que se definiu no século III da era cristã e predominou na filosofia pagã do período tardio da antiguidade, até o ano 529. Na época, três correntes ideológicas disputavam a primazia: o cristianismo, em ascensão; as religiões politeístas do paganismo; e as correntes filosóficas gregas e, em particular, o estoicismo.

O grande expoente do neoplatonismo foi Plotino, que elaborou a teoria da emanação ou panteísmo neoplatônico, segundo a qual o ser divino e o mundo são, em última análise, idênticos. Para Plotino, o mundo* não foi produzido do nada, mas emanou do próprio Uno, Divindade e Bem Supremo do qual procedem por emanação todas as coisas.

Do Uno deriva, primeiramente, o nous ou espírito, explicação de todas as coisas ao nível ideal e que equivale claramente ao mundo das idéias platônico. Do nous emana a alma, nome genérico que abrange três níveis distintos e hierarquizados: a alma suprema, que permanece em estreita união com o nous; a alma do todo, criadora do universo físico; e as almas particulares, que animam os corpos, os astros e todos os seres vivos.

O mais inferior grau da emanação divina é a matéria, ou o mundo perceptível pelos sentidos. Plotino afirma que, ao chegar a esse nível extremo, a potência do Uno está enfraquecida a ponto de exaurir-se. A matéria sofre, pois, a privação do Bem Supremo e pode-se-lhe chamar de mal -- não uma força negativa autônoma que se opõe ao bem, mas a ausência do bem.

Se der atenção apenas a seu corpo, o homem -- alma (preexistente) que habita um corpo -- se vincula ao mal e esquece suas origens. A alma precisa despojar-se da ilusão da matéria, e só o consegue por meio do êxtase místico, no qual é exaltada e preenchida pelo Uno. Esse êxtase não é um dom gratuito de Deus, mas fruto do esforço do homem para unir-se à Divindade.

Amônio Sacas, fundador da escola de Alexandria (em torno do ano 200), foi o mestre com quem Plotino estudou por 11 anos (de 232 a 243) e de quem recebeu influência decisiva. Em 244, Plotino mudou-se para Roma e fundou sua própria escola. Após ensinar por dez anos, escreveu 54 tratados, posteriormente dispostos em seis grupos de nove por seu discípulo Porfírio, que deu à obra o título de Enéadas.

Outras escolas neoplatônicas se formaram, como a da Síria, fundada por Jâmblico, pouco depois do ano 300; a de Pérgamo, fundada por Edésio, discípulo de Jâmblico; a de Atenas, iniciada por Plutarco entre os séculos IV e V, que teve em Proclo seu representante mais insigne. Com o célebre edito de 529, Justiniano proibiu o funcionamento das escolas filosóficas de Atenas. O neoplatonismo persistiu ainda na segunda escola de Alexandria, que renascera na mesma época da fundação da escola de Atenas e sobreviveu até princípios do século VII.

f.: Barsa CD v. 1.11 (1995). Baseada na Nova Enciclopédia Barsa. São Paulo: Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações (1 CD).

ENCYCLOPAEDIA V. 51-0 (11/04/2016, 10h24m.), com 2567 verbetes e 2173 imagens.
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